Militar da Base de Apoio e Administração do Ibirapuera arrisca sua vida para salvar pessoas em perigo e agora está doente sem o respaldo da corporação
Certamente a história do soldado do Exército Brasileiro Elton Lima não é a primeira e nem será a última, mas é o retrato do descaso e da falta de reconhecimento.
O soldado estava de férias em sua residência, quando ouviu as súplicas de uma mãe e vizinha implorando por socorro. Destemido, o militar não pensou duas vezes e se dirigiu para a casa da senhora. Lá detectou um forte vazamento de gás e encontrou uma criança, que foi socorrida prontamente. Também impediu que o avô dessa criança entrasse no imóvel, instantes antes dele explodir.
Da explosão ao recomeço
O Soldado do Exército Brasileiro que mesmo em férias salvou duas vidas e se feriu gravemente na explosão. Ele foi socorrido pelos companheiros de farda que o levaram até o Hospital do Exército, onde recebeu todos os cuidados necessários naquele momento, como a intubação.
O soldado ficou em coma por 22 dias, teve um comprometimento renal que o levou à duas hemodiálises. Nesse momento Elton Lima já estava desenganado pela equipe médica do hospital quando, milagrosamente, começou a acordar do coma.
Com a extubação teve que ser submetido a uma traqueostomia e longas sessões de fisioterapia. Foram seis meses hospitalizado, com complicações que testaram a fé de sua esposa Maria Cecília e demais familiares. Desde problemas com a própria traqueostomia (que teve que ser refeita), à complicações decorrentes das queimaduras que acometeram sua garganta.
Hoje, o soldado Elton Lima continua com a traqueostomia e passou a ter limitações, como falta de ar quando faz algum esforço físico e/ou entupimento do procedimento. Continua em tratamento e não sabe quando terá uma alta definitiva.
Exército vai licenciar o soldado herói
Depois de arriscar sua vida para salvar a vida de uma criança e a de um idoso o Exército Brasileiro quer descartar o soldado herói. Quer desincorporá-lo por incapacidade física definitiva, mesmo sabendo que Elton Lima não tem mais condições de exercer qualquer atividade laboral, no próprio Exército ou na inciativa privada.
As limitações decorrentes do acidente impedem o jovem soldado a se candidatar a qualquer vaga. Mesmo apresentando um currículo impecável, as empresas não irão contratar um cidadão que necessita dar continuidade ao tratamento médico.
A família, casal e três crianças, espera por um apoio do Exército Brasileiro, pois precisa de ajuda para cuidar desse herói que tanto contribuiu com a corporação. Eles não têm outra fonte de rendimentos e precisa dessa renda que o Exército ainda proporciona. O desligamento está previsto para acontecer em 28 de fevereiro de 2021.
O comandante do soldado, que serve na Base de Apoio e Administração do Ibirapuera em São Paulo, foi consultado pelo Escritório de Advocacia que o representa, in casu, Januário Advocacia, a oferecer algum tipo de ajuda, mas o mesmo em audiência realizada no dia 09 de janeiro, diz não poder fazer nada, pois, vai cumprir o que determina o regulamento. Ninguém da corporação nunca esteve na casa do soldado para saber como ele estava e se precisava de alguma ajuda.
A família está de mãos atadas e pede socorro para que o Exército Brasileiro, cujo lema é “Braço Forte, Mão Amiga”, não abandone um herói que ainda faz parte dos seus quadros, e que por exercer com dignidade e coragem a sua função, está dependente de um tratamento prolongado e de ajuda para prover o sustento dele próprio e da família.
A situação do soldado Elton Lima é um paradoxo se comparada à do General Vilas Boas, ex-comandante do Exército Brasileiro que recentemente mesmo inválido, continuou a frente do Comando do Exército, e gozando dos privilégios inerentes ao posto; e mais recentemente, mesmo dependente de terceiros, ocupa o cargo de Assessor Especial do Gabinete de Segurança Institucional. Enquanto isso, o soldado Elton Lima não contará com nenhum amparo da Instituição.
Desincorporação pode ser legal, mas não é humana
A desincorporação, que é uma forma de exclusão do serviço ativo, está prevista na Lei nº 4.375/64, que determina que ela acontece quando um militar permanece doente ou que se acidentou em serviço permanece 90 (noventa) dias consecutivos ou não em tratamento médico. Após esse prazo, o militar temporário e o praça sem estabilidade será excluído das fileiras militares mediante desincorporação. Ela acontece também no caso de incapacidade definitiva para o serviço militar.
Essa exclusão vem acompanhada de um total desamparo financeiro, como prevê a Lei do Serviço Militar, editada em pleno regime de exceção. Isso quer dizer que o militar além de doente, retornará para sua família desempregado e sem condições de recolocação no mercado de trabalho formal, então ele fica sem o amparo das Forças Armadas e sem o amparo do INSS já que não contribuía para esta autarquia.
Essa determinação está prevista em lei, mas nem de longe parece ser justa e estar em conformidade com a Constituição Federal, que tanto protege a dignidade da pessoa humana.
Wolmer de Almeida Januário é advogado inscrito na OAB/SP 398.062 e sócio-fundador do Escritório Januário Advocacia.
Começou sua carreira militar na década de 80 quando prestou o serviço militar obrigatório na Academia da Força Aérea Brasileira, no período de 1985 a 1986. Em 1990 prestou concurso para a Escola de Sargentos das Armas (EsSA), tendo concluído o curso de Infantaria e designado para servir no 13º Pelotão de Polícia do Exército, em Cuiabá (MT), onde permaneceu de 1991 a 1995, quando foi transferido para Brasília a fim de servir na Diretoria de Inativos e Pensionistas (atualmente denominada Diretoria Civis, Inativos, Pensionistas e Assistência Pessoal) lá permanecendo até o ano de 2001, quando foi reformado em razão de uma hérnia de disco. Em Brasília, no ano de 2000, concluiu o curso de Direito, na Universidade de Brasília (UNB).