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A Revisão das Reformas Militares

Atualmente em razão do artigo 112-A do Estatuto dos Militares, que possibilitou à administração militar rever, a qualquer momento, os atos de reforma, muitos militares têm dúvidas quanto ao alcance do referido dispositivo. O citado artigo foi acrescentado ao Estatuto dos Militares pela Lei nº 13.954, de 16 de dezembro de 2019, e assim prescreve:

“Art. 112-A. O militar reformado por incapacidade definitiva para o serviço ativo das Forças Armadas ou reformado por invalidez poderá ser convocado, por iniciativa da Administração Militar, a qualquer momento, para revisão das condições que ensejaram a reforma.             (Incluído pela Lei nº 13.954, de 2019)

§ 1º O militar reformado por incapacidade definitiva para o serviço ativo das Forças Armadas ou reformado por invalidez é obrigado, sob pena de suspensão da remuneração, a submeter-se à inspeção de saúde a cargo da Administração Militar.             (Incluído pela Lei nº 13.954, de 2019)

§ 2º Na hipótese da convocação referida no caput deste artigo, os prazos previstos no art. 112 desta Lei serão interrompidos.             (Incluído pela Lei nº 13.954, de 2019)” g.n

No entanto, o referido artigo 112-A não pode ser interpretado de forma isolada, sob pena de incorrer em equívoco, mas conjugando-o com o artigo 112 que continua em vigor e assim dispõe:

“Art. 112. O militar reformado por incapacidade definitiva que for julgado apto em inspeção de saúde por junta superior, em grau de recurso ou revisão, poderá retornar ao serviço ativo ou ser transferido para a reserva remunerada, conforme dispuser regulamentação específica.

§ 1º O retorno ao serviço ativo ocorrerá se o tempo decorrido na situação de reformado não ultrapassar 2 (dois) anos e na forma do disposto no § 1º do artigo 88.

 § 2º A transferência para a reserva remunerada, observado o limite de idade para a permanência nessa reserva, ocorrerá se o tempo transcorrido na situação de reformado ultrapassar 2 (dois) anos.”

Assim, quando o artigo 112-A se refere “a qualquer momento”, não significa que a administração militar tem uma carta branca para convocar o militar quando bem entender, não é isso, essa convocação deve ocorrer dentro do prazo dos 02 (dois) anos previstos no artigo 112 que continua em vigor, isto para o caso do militar ser julgado “apto” e for possível retornar ao serviço ativo.

No caso de ultrapassar 02 (dois) anos na situação de reformado, mas não ultrapassado o prazo 05 (cinco) anos, no caso do militar ser julgado “apto” poderá ele observado o limite de idade ser incluído na reserva remunerada.

Agora, ultrapassado o prazo de 05 (cinco) anos a contar do primeiro pagamento dos proventos na condição de reformado, opera-se a decadência, e neste caso a administração militar não mais poderá convocar o militar a fim de se rever o ato de reforma, porque assim determina lei:

“Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999 – Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. […]

Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.

§ 1o No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.” g.n

Aliás, essa alteração da lei para se rever o ato de reforma era totalmente desnecessária, porque a Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que tratou de regular o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, em seu artigo 54, como demonstrado anteriormente, fez previsão legal de que o ato administrativo pode ser revisto em qualquer época, mas desde que comprovada má-fé.

Portanto, desde que o processo de reforma do militar tenha seguido os tramites legais, não há que se falar em revisão do ato de reforma “a qualquer momento”, pois, a Lei nº 9.784/99 limitou em 05 (cinco) anos o prazo para que a administração pública federal revesse os seus atos.

E o entendimento do eg. Superior Tribunal de Justiça, é a de que o prazo decadencial de 05 (cinco) anos para se rever o ato administrativo concessivo de proventos e pensões, conta-se a partir do primeiro pagamento:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. REVISÃO DE PROVENTOS/PENSÕES. DECADÊNCIA DO DIREITO DE REVER ATO ADMINISTRATIVO. PRESTAÇÕES CONTÍNUAS. TERMO INICIAL.

DATA DO PRIMEIRO PAGAMENTO. ART. 54 DA LEI 9.784/1999. 1. Cuida-se, na origem, de Mandado de Segurança impetrado por Alda Cândida Nascimento Valadares e outros contra ato imputado ao Diretor-Geral e ao Reitor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo, para determinar às autoridades coatoras que se abstenham de proceder a qualquer redução da vantagem do artigo 184, inciso II, da Lei 1.711/1952, bem como a qualquer desconto nos proventos/pensões dos impetrantes, a título de reposição ao erário.

2. É firme no STJ o entendimento de que, em se tratando de atos de que decorram efeitos patrimoniais contínuos, como aqueles decorrentes de pagamentos de vencimentos e pensões, ocorridos após a entrada em vigor da Lei 9.784/1999, nos quais haja pagamento de vantagem considerada irregular pela Administração, o prazo decadencial de cinco anos é contado a partir da percepção do primeiro pagamento indevido, consoante reza o § 1º do art. 54 da Lei 9.784/1999.

3. In casu, cuidando-se de pretensão de revisão de proventos/pensões, o termo inicial do prazo decadencial do art. 54 da Lei 9.784/1999 conta-se a partir do primeiro pagamento errôneo, o que se deu em abril de 2005, findando-se o referido prazo em abril de 2010, não havendo dúvidas de que decaiu o direito da Administração Pública de rever, em maio de 2010, os benefícios percebidos pelos recorrentes.

4. Recurso Especial de Alda Cândida Nascimento Valadares e outros provido, a fim de que seja reformado o acórdão recorrido, para reconhecer a decadência no caso concreto. Julgo prejudicado o Recurso Especial do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo.

(REsp 1758047/ES, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/09/2018, DJe 21/11/2018).

Tem mais, uma vez homologado o ato de reforma pelo Tribunal de Contas da União, somente este órgão tem competência para determinar qualquer alteração relacionada com o ato de reforma, é o que determina a Súmula 199 do TCU:

“SÚMULA – TCU Nº 199 Salvo por sua determinação, não podem ser cancelados pela autoridade administrativa concedente, os atos originários ou de alterações, relativos a aposentadoria, reformas e pensões, já registrados pelo Tribunal de Contas, ao apreciar-lhes a legalidade, no uso da sua competência constitucional.”

E outra razão para o militar que já se encontrava reformado anteriormente a Lei nº 13.954/2019 não ter o que se preocupar, é que as disposições contidas no Estatuto dos Militares não retroagem para alcançar situações já definidas antes da vigência da referida lei. Veja o que determina o Estatuto dos Militares:

LEI Nº 6.880, DE 9 DE DEZEMBRO DE 1980 […]

Art. 157. As disposições deste Estatuto não retroagem para alcançar situações definidas anteriormente à data de sua vigência. ” (g.n)

Como se vê acima, qualquer alteração no Estatuto dos Militares só alcança situações futuras; o artigo 5º inciso XXXVI, da Constituição da República, alberga a garantia de segurança na estabilidade das relações jurídicas, na qual está inserido o ato jurídico perfeito:

“CF.  Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […]

XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”

Ora, se não houvesse uma segurança jurídica, o militar mais vulnerável sempre ficaria à mercê das liberações pessoais de determinada autoridade militar, que poderia se utilizar do posto que ocupa para editar atos administrativos com a finalidade prejudicar determinado subordinado, mas felizmente hoje se tem uma Lei de Abuso de Autoridade para conter esses impulsos que não atendem ao interesse público, vejamos:

“Lei nº 13.869, de 5 de setembro de 2019 – Dispõe sobre os crimes de abuso de autoridade.

Art. 33.  Exigir informação ou cumprimento de obrigação, inclusive o dever de fazer ou de não fazer, sem expresso amparo legal:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.” (g.n)

Como se observa da lei acima transcrita, exigir do militar reformado há mais de 05 (cinco) anos, o comparecimento à inspeção de saúde em grau revisional, pode sim ser configurado o delito de abuso de autoridade, por não haver expresso amparo legal para essa determinação.

Assim, de toda a forma, a convocação para o militar reformado ser inspecionado em grau revisional deverá obedecer a forma prescrita em lei (art. 26 da Lei nº 9.784/99), sendo aconselhável, que o militar convocado contrate um advogado ou advogada para acompanhar o respectivo processo administrativo.

[i] WOLMER DE ALMEIDA JANUÁRIO

2º Sargento de Infantaria do Exército Brasileiro, Turma Montese – 1990 (EsSA), Bacharel em Direito pela Universidade de Brasília, Advogado inscrito na OAB/SP sob nº 398.062, Sócio-Fundador do Escritório Januário Advocacia.

e-mail: wolmer.januario@januarioadvocacia.com.br

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